segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

A Privatização das Águas

Os chamados "monopólios naturais" estatais, como por exemplo a EPAL, no que diz respeito ao abastecimento de águas e à drenagem e tratamento de águas residuais não são, para começar, propriamente "naturais". Eles resultam directamente da intervenção do Estado, intervenção esta que se intensificou ao mesmo tempo que a população se foi tornando cada vez mais urbana e menos rural. Foi o aumento da concentração de pessoas nas grandes cidades e nas zonas e perifericas urbanas que "forçou" o Estado a tomar conta deste problema, sem dúvida um problema importante e determinante para que exista uma boa saúde pública, pois sem saneamento e fornecimento de água potável, a irradicação de pestes e doenças (como por exemplo o tífo e a cólera) seria praticamente impossivel. Foi portanto o Estado forçado pelas necessidades dos cidadãos e outras instituições empresariais, militares e estatais e não a "natureza" deste negócio que criou o monopólio existente. Nos meios rurais e de fraca industrialização, cada vez mais humanamente desertificados, subsiste por enquanto um regime de acesso ao recurso água que se aproxima daquele que seria o regime ideal. Um regime ideal seria aquele em que a água seria gerida pelas comunidades locais, com o envolvimento directo de empresas especializadas e sob a supervisão das autarquias e da sociedade civil, em função da qualidade e disponibilidade deste recurso. Na grande maioria dos casos esta gestão descentralizada aconteceria sem conflitos de maior e portanto sem a necessidade de uma intervenção directa da administração central e raramente regional, apenas com uma legislação básica que impuse-se padrões mínimos de qualidade e salubridade.

As políticas nacionais de desenvolvimento económico e de ordenamento "estruturado" do território, em geral da exclusiva responsabilidade do Estado, levaram pois a que o problema "surgisse" e se gravasse. Nas grandes cidades e aglomerados urbanos não é fácil se imaginar uma forma de voltar a um modelo liberal de gestão dos recursos aquíferos, mesmo na hipótese de total privatização dos sistemas existentes, já que em jogo estaria agora a transferência de um monopólio estatal para diversas empresas privadas, naturalmente interessadas neste negócio e até dispostas a pagar por ele um preço, porventura elevado. O qual iria depois ser imputado aos consumidores por via de aumentos do custo dos serviços. O que está em causa, como se sabe, o facto de ser pouco viável para os operadores a multiplicação das redes (devido ao alto investimento que implica a criação de uma nova rede e assim como os elevados custos de manutenção que uma rede implica) e de não ser em regra viável para o consumidor mover-se de uma área para outra tirando partido dos preços mais baixos e/ou da melhor qualidade deste serviço, de resto apenas marginalmente importante para a sua vida ou actividade, não criando condições para que exista do ponto de vista do consumidor uma real mobilidade entre empresas concorrentes.

À semelhança do que sucede com o abastecimento de electricidade, gás e, em menor escala, com a rede fixa de telecomunicações, os especialistas equacionam então a possibilidade de privatizar o serviço, mas não a rede, que seria utilizada por todos os operadores concorrentes mediante o pagamento em proporção dos custos inerentes à sua utilização. Porém, se nas telecomunicações esta hipótese é tecnicamente viável e já praticada, para a electricidade e, em maior escala, para o abastecimento de água, ela levanta dificuldades técnicas maiores que são já muito conhecidas e intensivamente analisadas pelos técnicos e empresas do sector. Não irei entrar por essa via, dado não ser esse o objectivo desta reflexão. O que se defende é que, seja qual fora solução para a criação da necessária concorrência no fornecimento destes serviços ambientais e básicos indispensáveis à qualidade de vida do homem moderno, a solução óptima irá sempre reduzir-se àquela que anteriormente por nós indicada ou seja, à gestão do recurso pelas comunidades locais, ajudadas por empresas especializadas do sector previamente licenciadas e com a supervisão e vigilância das autarquias e das organizações da dedominada sociedade civil (locais, regionais, nacionais e em casos especiais internacionais). Uma gestão descentralizada, flexível e sensivel às necessidades locais, ao nível da que se pretende que vigore para todos aqueles serviços que não cabem na categoria (algo enganosa como se viu) de "monopólios naturais".

A solução para o problema implica pois no nosso entender as duas perspectivas: uma destas é a definição de políticas de desenvolvimento, necessariamente de médio e longo prazo, que facilitem e estimulem a fixação de pessoas e jovens fora das grandes cidades e aglomerados urbanos, políticas estas devidamente articuladas com políticas de emprego e de transportes tendentes ao mesmo objectivo que sejam sustentáveis com o meio ambiente local. A outra é a "privatização selectiva e progressiva" dos sistemas existentes, começando por aqueles em que seja mais fácil introduzir modelos de gestão efectivamente descentralizados e passíveis de um adequado controlo por parte das comunidades locais e claro com capacidade de serem rentáveis. Certamente que poderá não ser um grande passo rumo à definitiva liberalização do sector, mas sem dúvida será um passo do qual poderão resultar importantes ensinamentos para futuros passos mais ambiciosos. Trata-se de um sector extremamente sensível e estratégico para a economia, assim como um pilar basilar para a sociedade, pois são serviços indespensáveis e não acessórios que todos os cidadãos, empresas e instituições necessitam para o seu normal funcionamento. E pensamos que o sucesso de qualquer alteração que se venha a fazer ao modelo de gestão existente dependerá de uma intervenção cada vez menor do Estado central e mais marcante das empresas, instituições e comunidades locais envolvidas.

Ao deixar-se esta situação continuar, irá o nosso país manter e agravar as perdas, assim como a nossa sociedade, ambiente e economia. Basta olhar-se para os indicadores sócio-economicos de desenvolvimento que o nosso país apresenta.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Negócios com o Ambiente

Abro aqui esta rúbrica sobre Negócios com o Ambiente. Devo desde já dizer, para enquadrar esta rúbrica melhor, que nada tenho contra os negócios ambientais em si mesmos e que não me oponho a que alguém possa legitimamente retirar lucro e quiça fazer fortuna à custa dessas actividades empresariais. Adapto em relação aos negócios com o ambiente a mesma postura que defendo para a generalidade dos negócios:

1. Eles tem que acontecer num contexto de mercado aberto, livre e onde a justa concorrência seja a força que mova os interesses do diversos intervenientes neste negócio;

2. Mais do que no estrito cumprimento da lei, que pode nalguns casos ser inválida ou até mesmo injusta, os negócios do ambiente devem desenvolver-se num quadro de valores onde devem pontificar o respeito pelas liberdades, pela vida e pela propriedade privada e pública. Não aceito que a defesa e a preservação do ambiente, bem como os negócios a tais desígnios associados, tenham que fazer-se em prejuízo do respeito de tais valores. Estou ciente da dificuldade dialéctica existente entre algumas tendências ambientalistas contemporâneas e as diversas formas de pensamento liberal, mas não acredito em nenhuma forma sustentável de resolver os problemas ambientais que dispense a regra do consentimento dos governados e a oscultação destes, que viole o princípio da autonomia ou que, dito de outro modo, implique a violação de certos princípios que, a coberto do designado "manto da ignorância", todos tenderíamos como politicamente iguais a aceitar e a subscrever no acto de fundação de toda e qualquer sociedade política;

3. Acredito, como alguns liberais, que as instituições são mais o resultado das nossas acções do que da nossa vontade. Não vejo portanto com bons olhos a criação de instituições ambientais do tipo autoritário, que tendem a criar na maioria do povo e dos agentes económicos a sensação de insegurança e de medo do incumprimento, poder não dever ser autoritário mas mandatado e sempre tendo como origem e destino o bem de quem o depositou pelo voto no exercício da democracia;

4. Creio que o estado de natureza que ainda prevalece nas relações entre os Estados, ou entre conjuntos de estados dos chamados blocos regionais (de que a UE é bom exemplo) é o maior obstáculo existente actualmente ao desenvolvimento sustentável à escala planetária, pelo que tenho a tendência para ver com bons olhos a transferência de determinados poderes e autoridade para instâncias supranacionais de governação. Não sou porém contra a soberania no sentido convencional. Os estados nacionais devem ser soberanos nas matérias que efectivamente representam hoje a substância da sua autonomia, ou seja aquelas que têm a capacidade de controlar e para as quais são de facto suficientes. Matérias como a segurança global em sentido lato, os direitos humanos (essenciais num estado moderno) combatendo o tráfico de pessoas e sua exploração, e gestão de recursos ambientais transnacionais, o narcotráfico e tráfico de armas assim como de matérias perigosas e potencialmente poluentes e a poluição transfronteiriça carecem actualmente de órgãos eficazes de soberania à escala supranacional, cuja legitimação terá obrigatoriamente que passar pelo desenvolvimento de formas inovadoras de exercício do escrutínio popular. Os Estados nacionais não podem continuar a fingir perante o povo que têm o controlo sobre estes assuntos transnacionais, cobrando-lhe em impostos por um serviço que a bem dizer não estão em condições de poder prestar, pois não existe verdadeira vontade política em alterar esta situação por parte da grande maioria dos estados, pois estão amplamente expostos a interesses individuais por terem uma liderança fraca, incompetente, mal renumerada, sendo por isso facilmente subornável o que por consequência cria o caos e o desrespeito pelas regras mais básicas da democracia e do povo.

sábado, 20 de dezembro de 2008

Ambientalista antropocêntrica

Sim, sou uma ambientalista antropocêntrica. Só consigo pensar na preservação do ambiente com o Homem presente neste. A Terra como planeta não necessita de descartar a espécie humana para ter uma harmonia ambiental. Será que existe algum ambientalista no mundo, com um neurónio em bom estado, que consiga parar e interrogar-se: afinal eu ando aqui a lutar pela preservação de tesouros naturais em nome de quem e do quê, e para quem? A quem interessa que eu faça isso? Será apenas à azinheira, ao sobreiro ou às sequóias, ao milhafre, ao falcão e aos papagaios exóticos, à cobra-de-água e ao saca-rabos que interessa o meu esforçado trabalho? Não andarei por acaso eu a guardar um tesouro que um dia (e na verdade já actualmente) só a nova geração vindora irá poder usufruir? E serei eu assim tão importante para, depois do trabalho feito, ser poupado e ter direito com os meus filhos a um lugar dentro das muralhas do castelo ecológico nascente? Ou será que, depois do trabalho feito e de já não precisarem mais de mim, acabarei por ser descartado sem qualquer utilidade como um objecto obsoleto? Haja pois esperança de que ao menos um ambientalista pare para reflectir estas minhas palavras. E todos juntos construiremos um mundo melhor, com o máximo de harmonia ambiental que sirva para termos também um bom presente e claro um melhor futuro.